Há algum tempo que a publicidade trabalha junto da antropologia para entender o consumidor. Um exemplo desta união é o reposicionamento que a Nestlé fez, em 2005, do biscoito Passatempo.
A marca foi reposicionada baseando-se em uma pesquisa antropológica titulada “O Olhar da Antropologia e da Pedagogia sobre a Importância de Brincar”. O estudo foi feito com crianças de São Paulo e do Rio de Janeiro durante dois anos, liderado por Paula Pinto, doutora em antropologia social pela Universidade de São Paulo.
Os resultados mostraram que, teoricamente, os pais sabem da importância das brincadeiras, mas a agenda apertada das crianças não lhes permite ter tempo para brincar. Nas classes mais abastadas, o tempo delas é preenchido com cursos e esportes, enquanto nas classes mais baixas, as crianças adquirem responsabilidades como cuidar da casa. Essa realidade faria com que muitos pais sentissem culpa e angústia em relação à situação dos filhos. Outra preocupação seria em relação à segurança dos pequeninos. As crianças, por outro lado, querem cada vez mais experimentar coisas novas fora de casa.
Foram estas informações que levaram a marca Passatempo a adotar um novo posicionamento, enfatizando a importância da brincadeira e incentivando as crianças a brincarem. Assim, a marca adotou o novo slogan “Porque brincar faz bem demais”. Além disso, o produto teve a embalagem reformulada, ganhou nutrientes em sua composição e até um novo mascote, representado por um macaco com traços humanos.
Não ficando por aí, para concretizar seu posicionamento e ampliar ainda mais a experiência com sua marca, a Passatempo, em parceria com o Cartoon Network, iniciou esforços de incentivo à valorização da cultura brasileira e da criatividade infantil, resgatando, segundo o Grupo de Mídia, brincadeiras clássicas que podem ser feitas com amigos e familiares. Deste modo, a partir do mês de agosto, passou a veicular no Cartoon sete programetes exibidos semanalmente, que mostram oito crianças ensinando diferentes formas de se divertir com os amigos. Como evidencia o vídeo abaixo, todas estas mudanças foram feitas para criar um vínculo emocional com o consumidor,
Evidentemente, essa preocupação possui explicação. Estudos antropológicos¹ afirmam que o consumo não tem função simplesmente utilitária, mas é socialmente construído. Além disso, ele é sensível a interpretações que envolvem significados culturais e públicos. As pessoas, por exemplo, podem consumir um produto por status, por identificação, por simplesmente quererem se engajar, e por outros diversos motivos emocionais.
Esta foi a aposta da Nestlé, posicionar a marca de acordo com os valores e interesses do público que mais consome seu produto. Parece que a estratégia deu certo: segundo a revista Supermercado Moderno, o passatempo é o biscoito mais consumido do Brasil.